Sinto um alívio tão grande quando a noite cai.
Com o silêncio, desaparece a pressão no peito, a aflição do coração que tanto se apressa, como desfalece.
As dores tornam-se mornas e posso ignorá-las.
Consigo até respirar fundo e fechar os olhos em calmo prenúncio de algum sossego.
Fico irritada quando o sono ataca, pelo tempo precioso que vou gastar a dormir.
E quando acordo, com a crueza das portadas abertas, fico logo aflita.
Lanço logo a mão da ingrata cafeína para me ajudar a arrancar.
Para a rotina, para a azafama, para a canseira sem sentido.
Fico sem forças a meio do dia, e arrasto-me até cair a noite, onde renasço um pouco mais…
É nesta altura, à luz da lua, em que já todos estão resguardados em casa, que me sinto um pouco eu.
Que me sinto segura, aninhada no meu canto com os meus.
Passo a pente fino as tarefas do dia, para ver se não me esqueci de nada.
Os animais estão tratados, os filhos e marido já jantaram, a loiça suja que se lixe, já acendi a vela que me guia pelos sonhos e hoje, noite de sorte, tenho ao colo o portátil do meu filho, e posso escrever um pouco.
Não sou mulher de grandes discursos, apenas a escrita, por mais estúpida ou ridícula que seja, me liberta, me situa, me preenche.
Amanhã ainda não consigo ir trabalhar.
Por este andar, ainda acabo por perder o emprego, ou pelo menos o respeito das colegas e dos patrões.
Sei que é difícil de acreditar que num dia estou bem, e no outro, contorço-me com dores e mal me consigo mexer…
Desta vez, foi a ciática que me derrubou.
É a 3ª crise este ano, e a mais violenta.
São as dores que mais temo.
Já me habituei às outras e melhor ou pior, já as integrei no meu dia a dia.
Mas esta treta da ciática custa-me a aguentar..
Assim que começo com sintomas, que tento ignorar a ver se passa, entro em pânico.
E o pânico afecta em muito a minha pseudo estabilidade emocional.
Às vezes pergunto-me se fosse uma pessoa equilibrada, calma, com os parafusos todos no sitio, se não teria tantas dores..
Os problemas físicos são reais, é claro, mas a capacidade de lidar com eles depende muito da força psíquica.
E eu, confesso, tenho pouca, e então nesta altura do ano, ainda é pior.
Valham-me as noites que me dão alguma paz de espírito, algum conforto, mesmo que as lágrimas me saltem sem razão.
Mesmo que o sono se entrecorte com sobressaltos e pesadelos, que se aplacam assim que vejo que lá fora, ainda está escuro…
Nem quero pensar que amanhã é outro dia.