Sei que não me lês.
Não me escutas.
Passas toda a tua existência paralela à minha, sem qualquer ponto de encontro.
Duas linhas paralelas nunca se encontram.
Mesmo que uma se retorça de aflição, e procure tocar a outra, que continua impávida o seu trajecto.
Duas linhas paralelas nunca se encontram.
Mesmo que tenham começado juntas.
Enquanto uma se debate em interrogações, em recusas em aceitar o óbvio por ser tão anti-natura, a outra..
Prossegue o seu caminho, impávida e serena.
Cruelmente cega, surda e muda.
Das linhas que eu gerei, fiz uma circunferência.
Enorme, forte, envolvente.
Sem bicos, sem arestas, sem dúvidas, sem principio nem fim.
Em contínuo movimento de dávida, partilha e simbiose únicas.
E quando fechar os olhos de vez, posso não levar mais nada comigo.
A não ser a certeza de ter amado, cuidado e protegido até à exaustão.
E de ter passado essa herança de puro amor à geração seguinte.
Um dia virá em que não restará sombra de linhas paralelas na linhagem que iniciei.
Não poderás dizer o mesmo, nunca, por mais que te sintas em paz com as tuas escolhas.
Tomaste as dores do desamor a que também foste votada, e deixaste-o crescer e tomar novo fôlego.
Como o mais horrendo mostro de brutais histórias infantis.
Segue então o teu caminho.
Paralelo ao meu.
Assumo as culpas que não tenho, para que o possas prosseguir sem sobressaltos.
Quando fechares os olhos de vez, talvez não tenhas tempo para pensares em tudo o que deixaste para trás.
E terás que cá voltar, uma e outra vez, e mais outra ainda, até que percas o teu rasto de desamor.
Pode ser que nos encontremos outra vez.
Em papeis diferentes.
Nessa altura, logo se verá…